24 de Março de 2019

"O silêncio eloquente de São José"

No dia 19 de março celebramos São José, Esposo de Maria e Padroeiro da Igreja. O que este santo homem nos ensina? Qual o seu legado? Nos dias de hoje, estamos carentes da presença segura e equilibrada de homens e mulheres que possam nos orientar. José tem muito a nos ensinar. Ao falar de São José, o presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, cardeal Gianfranco Ravasi, nos concede uma linda catequese sobre José.

“A figura de São José tem uma presença limitada. Ele está em primeiro plano somente em relação ao início da vida de Jesus. O Evangelho de Mateus dedica-lhe a Anunciação do Anjo, ao contrário de Lucas que dedica a Maria. Podemos dizer que é somente no início absoluto de sua existência, da existência de Cristo, que apare essa figura.

Aparece por duas razões e aqui entramos também na questão da “desobediência”. Aparece, em primeiro lugar, porque é ele quem tem essa ascendência, que naturalmente no mundo oriental era bastante vago, com Davi, e portanto dá a linha davídica a Jesus, introduzindo-o no grande rio do messianismo.

Por outro lado, é ele quem vive a experiência do vínculo com Maria e dessa surpresa que abala sua vida, e ele se sentiria pronto para romper o vínculo com Maria, como se desobedecesse a esse projeto que tinha construído: de estar junto com essa moça, com essa mulher. Não nos esqueçamos de que José provavelmente não era o idoso representado também no imaginário artístico, iconográfico. Está pronto para interromper esse projeto comum, mas é nessa escolha que irrompe a Anunciação, que muda radicalmente o seu projeto e o torna obediente por excelência: torna-se instrumento fundamental para o reconhecimento de Jesus no contexto social, como pai putativo.

Diferentemente de muitos outros personagens dos Evangelhos, é um personagem central no início, mas é mudo: não temos uma palavra sequer. Em relação a Maria temos seis frases, digamos cinco frases e um canto, o ‘Magnificat’. Na verdade, é pouco também para Maria, pois são frases breves as cinco palavras de Maria. Ao contrário, para José temos o silêncio absoluto. Eu diria que o ‘preferir’ é uma lição constante dentro dos Evangelhos, como Jesus prefere os últimos.

Como dizia o poeta francês, Paul Valéry, preferir sempre a palavra ‘moindre’, a menor, a mais delicada em relação à palavra gritada, brutal e agressiva que estamos acostumados a ver no âmbito político, na informática, onde domina não somente a agressividade mas também a vulgaridade. A palavra que é acesa até ficar quente. Sabemos bem que a palavra é uma ‘criatura viva’: dizia outro poeta francês, Victor Hugo, e como tal pode também ferir, se não às vezes até matar”

Sobre a devoção que o Papa Francisco tem a São José, Cardeal Ravasi explica: “É a imagem de São José dormindo. Sabemos que existe também na iconografia. Bassano, por exemplo, representou José dormindo que recebe a anunciação ou recebe os sonhos que, como sabemos, na linguagem bíblica são uma maneira de representar uma comunicação transcendente, espiritual: não é necessariamente tudo o que concebemos através da visão psicanalítica, a leitura onírica com uma interpretação ‘científica’. Enquanto que para a tradição bíblica, e para toda a antiga tradição oriental, é uma maneira de expressar a profunda experiência religiosa, portanto, uma experiência espiritual, ascética e mística.

Essa figura já é significativa, porque José é por excelência o homem que recebe essas mensagens à noite, nos momentos dramáticos da existência de seu filho oficial, seu filho jurídico. É por esse motivo que podemos dizer que seja, mais uma vez, uma figura sugestiva, porque tem a capacidade de ir em profundidade, sem muita conversa. Os evangelhos apócrifos acrescentam muitos detalhes, mas há um evangelho apócrifo chamado “José, o carpinteiro” que representa sua morte, José deitado numa espécie de névoa do fim da vida, que tem Cristo ao seu lado. Ele diz as últimas palavras em relação a Maria: ‘Eu amei essa mulher com ternura’, e depois morre.

Peço a intercessão de São José para todas as famílias. Quando o barulho nos atrapalhar e provocar em nós raiva e insatisfação, roguemos a São José. Muitas vezes o silêncio pode ser a solução.


Dom Anuar Battisti