Artigo: Uma análise dos Planos de Pastoral Orgânica da Arquidiocese de Maringá

18 de Novembro de 2019

Artigo: Uma análise dos Planos de Pastoral Orgânica da Arquidiocese de Maringá

O Portal da Arquidiocese de Maringá, tem a grata satisfação de compartilhar o artigo escrito pelo padre Eduardo Batista sobre “A Ação Pastoral projetada e executada na Arquidiocese de Maringá no Pós-Concílio – Uma análise dos Planos de Pastoral Orgânica”.

Um material enriquecedor que possibilita aos leitores ampliar o conhecimento do trabalho pastoral desenvolvido ao longo das décadas pela Igreja particular de Maringá.


Apresentamos neste artigo uma investigação acerca da pastoral da Arquidiocese de Maringá, a partir de uma abordagem situada no contexto do pós-concílio Vaticano II e latino-americano. O objetivo principal desse texto, dividido em três partes será identificar o modo como a ação pastoral foi projetada e executada, desde os primórdios até os dias atuais.


A Criação da Diocese de Maringá

Sendo fundada em 1948, a cidade de Maringá constituída de longas áreas de terra vermelha, com grande plantio de café, brotou do vigor de homens e mulheres que com a força do braço domavam a mata e venciam o trabalho por meio da produção do solo.

Recebe o reconhecimento da Santa Sé, erigindo-a na condição de diocese oito anos e nove meses de sua fundação (ROBLES, 2005, p. 45), e recebe o primeiro bispo um ano mais tarde, assim a 1º de fevereiro de 1956 por meio da bula Latissimas Partire Ecclesiais, é criada a diocese de Maringá.

Saída da mata para encontrar no desenvolvimento empreendedor de fé e cultura, a diocese de Maringá, que poucos anos após sua criação se elevara ao grau de Arquidiocese, em 20 de janeiro de 1980, tornou-se comprometida com a ação evangelizadora, implantando um caminho de uma pastora orgânica, em sintonia com os documentos e decretos conciliares, diretrizes nacionais e regionais.

Aos 24 de março de 1957, chega pela primeira vez a solo maringaense o novo bispo, que é recebido já no campo de pouso por uma multidão de quase 30 mil pessoas. Tendo assumido como meta de seu episcopado o ardente desejo de ajudar as pessoas a descobrirem que “Jesus Cristo deveria ser tudo em todos”, dom Jaime escreveu: “Vós, queridos diocesanos de Maringá, que soubeste em tão pouco tempo tornar uma realidade viva de progresso e de esplêndidas realizações o solo ubertoso do Norte do Paraná, avantajai-vos, agora, de maneira mais sublime e mais nobre ainda, na implantação em nossa diocese da semente preciosa do Amor de Deus, que agora os grandes e salutares mistérios de vida sobrenatural”.


Dinamismos pastorais e organização eclesiástica da diocese de Maringá

O caminho pastoral percorrido pela diocese de Maringá, está diretamente relacionado aos apelos do Concílio Vaticano II, que tratou de ser um concílio eminentemente pastoral, com discussões doutrinárias e de fortalecimento dos laços cristãos.

Com o êxodo rural provocado pela crise do café e a mecanização da agricultura, muda-se o rosto da evangelização na diocese de Maringá. Impulsionada pela Conferência Episcopal de Puebla (1979), uma nova pastoral orgânica centrada em comunidades de base, em conselhos paroquiais e dirigentes leigos e leigas protagonistas da vida eclesial, começam a surgir.

A criação da coordenação de pastoral se deu para organizar o conjunto da ação da Igreja, sendo profética e um sinal no meio do povo. Na diocese de Maringá a iniciativa de dispensar um padre dos trabalhos paroquias para se dedicar exclusivamente à pastoral diocesana, se deu em 1968 quando o bispo diocesano apresentou os padres, Pe. Antônio de Pádua Almeida e Pe. Orivaldo Robles como coordenadores da pastoral diocesana. Em seguida o Pe. Vicente Costa assumiu a função e no cargo até o ano de 1985. De lá para cá, a diocese contou com o auxílio de tantos outros padres nessa função

O caminho assumido pela Diocese ao longo desses anos de evangelização pastoral, foi da descentralização, distribuindo responsabilidades também aos leigos e leigas engajados. As iniciativas de novas formas de organização e participação popular, como as assembleias diocesanas (desde 1971), criação do conselho de ação pastoral reunindo clérigos e leigos e leigas (2006), criação do conselho de leigos (2009), e a divisão de equipes de trabalho, foi surgindo lentamente e um novo estilo de animação pastoral foi sendo desenvolvido.


Opção pastoral da Diocese de Maringá à luz do Concílio Vaticano II

A renovação pastoral e teológica suscitada pelo Concílio Vaticano II mostrou através de seus documentos, que a vida da Igreja não só se renova por uma reflexão do Evangelho trancado nos muros de uma imponente construção de um templo físico, mas também, através dos estímulos externos dos acontecimentos e das circunstancias sociais.

Na Diocese de Maringá desde muito logo se fez a opção de um trabalho em conjunto, onde todos em seus ministérios e carismas diferentes fossem valorizados. Celebrada todos os anos, as assembleias diocesanas tiveram uma mudança metodológica no ano de 1987, quando passaram a ser realizadas a cada biênio. Sua realização a cada dois anos permaneceu até o ano de 1989, quando passaram para o período de três anos.

Através desse avanço eclesiológico, vê-se uma Igreja cada mais próxima das realidades das pessoas, identificada com as necessidades e aspirações populares, mais preocupada com a vivência do evangelho do que com a sobrevivência das formas institucionalizadas vigentes.


Planos de Pastoral Elemento Unificador da Atividade Pastoral da Arquidiocese de Maringá

O processo de planejamento bem compreendido é profundamente evangélico, devendo partir das situações concretas de cada tempo, para então, interpreta-las à luz da fé. O ponto de partida para toda ação pastoral deve ser sempre o olhar sobre a realidade, que permite a confluência da teologia e da pastoral no mesmo projeto pedagógico.

O olhar sobre a realidade constituiu um importante processo para reflexão e prática teológico-pastoral. Por isso, dentro do processo das estruturas de planejamento se encontram os planos de pastoral, que partindo da realidade, apresentam ações concretas que correspondam com a necessidade de cada tempo.

Quando se decide instaurar um processo de planejamento diocesano, é preciso estar atento a alguns requisitos básicos: “Fase de reflexão e decisão; fase de montagem dos planos; fase do acompanhamento da ação; fase de revisão e avaliação” (CNBB, 1966, p. 71).

A pedido do Papa João XXIII, a CNBB no ano de 1962, elaborou pela primeira vez um plano de ação – Plano de Emergência -  onde tentou refletir e planejar a ação da Igreja no território nacional. Depois no ano de 1966, elabora o Plano de Pastoral de Conjunto como forma de “criar meios e condições para que a Igreja no Brasil se ajustasse, o mais rápido possível, à imagem de Igreja do Vaticano II”, e em 1974 elabora as “Diretrizes Gerais da Ação Pastoral da Igreja no Brasil”.

Será nesse período de progresso e renovação pastoral, que a Diocese de Maringá, no ano de 1973, conseguirá pela primeira vez elaborar o seu primeiro plano de pastoral orgânica, lançando as bases para uma ação planejada na vida da Igreja local.


Processo metodológico assumido na elaboração dos planos

Escolher um método é um passo muito importante para que o Planejamento Pastoral encontre seu êxito. A Igreja Latino Americana assume o método Ver-Julgar-Agir, para seu desenvolvimento pastoral. Esse método ajuda a olhar de forma panorâmica a realidade social e eclesial, além de apresentar os princípios da Palavra de Deus e de construção do Reino, para somente depois, elaborar uma ação que seja coerente com a necessidade que se fez sentir.

Esse método surge com Joseph Cardijn em 1925, com objetivo de transformar as realidades históricas. Posteriormente, é assumido como o método do Concílio Vaticano II e se tornou mais que um método em si, mas uma pedagogia, uma forma de ser Igreja.

 A partir dessa fonte inspiradora os Planos de Pastoral da diocese de Maringá serão elaborados. Partindo da realidade concreta, as ações são pensadas e desenvolvidas em vista da transformação da comunidade eclesial e social.

Em todos os vinte e quatro planos de pastoral da Diocese, encontramos o método Cardjinista. Servir-se desse método, permitiu privilegiar a ação dos leigos e leigas que devem ter participação ativa em todas as obras de evangelização da Igreja. Mais do que destinatários, os leigos e leigas são agentes diretos da evangelização.      

Dentre as diversas instâncias em que os leigos e leigas podem atuar numa Igreja diocesana, estão as assembleias diocesanas. Na diocese de Maringá, registra-se sua primeira assembleia no ano de 1972, e que, ao longo desses anos o modo de atuação e de condução dos trabalhos foram sendo cada vez mais aprimorados.


Linhas de trabalho adotadas pelos Plano de Pastoral

As linhas de ação assumidas pela Diocese de Maringá sempre estiveram em consonância com a Igreja Latino Americana e em comunhão com as Diretrizes Gerais da Ação Pastoral da Igreja no Brasil. Desde o primeiro plano de pastoral, encontramos três linhas de trabalho que perpassaram ao longo desses anos, seja de maneira direta, ou de modo transversal, são elas: promoção da unidade visível; família e a juventude; e as comunidades eclesiais de base.

O desejo sempre foi elaborar uma ação que atendesse a demanda do território diocesano e inserisse cada vez mais as pessoas na atuação eclesial. A partir dessas prioridades, a proposta foi sempre promover a integração do laicato nas ações eclesiais, criando a consciência de corresponsabilidade na evangelização. A cada década essas prioridades que se destacaram foram sendo aprimoradas e fortalecidas desde as instâncias diocesanas até a nível paroquial. Resumidamente apresentamos os destaques de cada década:

Anos 70: Elaboração dos primeiros Planos de Pastoral – Pastoral Circular e de Conjunto - Criação dos conselhos a nível Diocesano e Paroquial - Movimento Juvenil, iniciado pelo Padre Antônio de Pádua Almeida - Implantação da pastoral do Bairro, sob a assessoria do Padre Valério Odorizzi.

Anos 80 - Elaboração de um Diretório para Administração dos Sacramentos a nível Diocesano - Criação do Conselho Arquidiocesano de Leigos – Publicação do documento “sobre os valores básicos da família” pela CNBB - Fortalecimento da Pastoral Familiar e da Pastoral da Juventude – Formações para implantação das Comunidades Eclesiais de Base.

Anos 90 - Evangelização a partir dos Meios de Comunicação Social – Impantação da Pastoral do Acolhimento, para acolher e ajudar as pessoas que migraram do campo para cidade - Evangelização da cultura urbana e o acolhimento das realidades como família e juventude – Implantação das CEB´s em todas as paróquias onde ainda não existem.

Novo Milênio - Participação colegiada entre todos os membros do povo de Deus - Os leigos devem ter participação ativa, criativa e responsável, não só na fase de execução, mas também de elaboração do planejamento da Ação Evangelizadora – Fortalecimento da Pastoral Familiar e da Pastoral da Juventude - atualização no modo como estruturar essas comunidades, para atender às necessidades do mundo em transformação.


Modelos Eclesiológicos e de Ação Pastoral que influenciaram na elaboração dos planos da Diocese de Maringá

Na real situação que se encontra a sociedade frente a globalização, tecnologias avançadas e o desenvolvimento da pós-modernidade, surge a necessidade da Igreja buscar uma nova linguagem e uma nova estrutura, que responda aos novos desafios da sociedade atual. Estar atento ao contexto em que está inserido é tarefa primordial para uma configuração eclesial contextualizada e histórica.

O Concílio Vaticano II foi um evento importante para esse processo de aproximação com o mundo moderno e de atualização nas estruturas eclesiais, o surgimento de uma nova eclesiologia voltada para os princípios de comunhão e participação, onde, todos os fiéis batizados dispõem da mesma condição fundamental de serem membros da Igreja e participantes de sua ação evangelizadora, permitiu com que transparecesse uma visão supletiva da participação laical.

Nutrida pela participação ativa dos leigos, a Igreja ampliou o seu conceito de Igreja Ministerial, deixando de estar associada apenas ao ministério ordenado, mas aos carismas que cada membro do povo de Deus possui e, pode colocar a serviço.          

Uma Igreja servidora e promotora da comunhão é, aquela que prioriza o protagonismo de todos os seus membros, de modo, que sua ação só será eficaz quando dentro desse conceito, todos os fiéis batizados incorporarem de modo efetivo o único corpo eclesial dando testemunho pleno da unidade (Lumen Gentium  8).

           

Modelos Eclesiológicos Subjacentes a Ação Pastoral Na Diocese de Maringá

A Igreja está fundamentalmente organizada a partir de três grandes instâncias, sendo elas, a Hierarquia, os religiosos e religiosas e os leigos e leigas. Cada um deles possuem seu próprio lugar dentro da Igreja e, exercem ministérios diferentes, porém, todos eles fazem parte do Povo de Deus, pois, esta dignidade foi incorporada através do batismo e não da função exercida dentro da Igreja. Todos são membros vivos da Igreja e são chamados a atuarem na difusão do Reino de Deus, através de um projeto histórico de justiça e libertação de todas as pessoas.

Este povo, se torna povo de Deus através do batismo e, na medida em que promovem a fé, a esperança e a caridade, formam um povo em marcha a serviço de todos. A comunidade do povo de Deus, ultrapassa os ditames da hierarquia e segue em direção ao serviço e não ao poder, inaugurando assim, um novo processo de estruturação eclesial.

A Igreja dos pobres pode realmente oferecer um conteúdo de experiência da salvação a todas as pessoas, por isso, a Igreja povo de Deus deve manifestar o serviço e a promoção da missão evangelizadora, comprometendo-se mais concretamente com uma sociedade mais justa, fraterna, solidária e verdadeiramente cristã.

As Conferências Gerais dos Bispos da América Latina e do Caribe, entenderam a Igreja a partir da prática e realização de uma eclesiologia que parte do contexto sociocultural e espiritual subjacentes as marcas históricas de seu povo e de seu tempo. “A Igreja não é mais aquela Igreja para o povo ou, Igreja do povo, mas é, a Igreja povo de Deus entre os povos do mundo que têm consciência de serem portadores da missão total da Igreja” (MULLER, 2014, p. 36).

Os pobres e os marginalizados, com base num encontro íntimo com o Evangelho, compreendem a si mesmos, na sua dignidade que participam ativamente, na vida da comunidade eclesial e, cumprem assim, a missão da Igreja de Sacramento de salvação para o mundo.

Na Diocese de Maringá, essa compreensão eclesial esteve presente desde os tempos de sua instalação canônica, e com o passar dos anos, esse conceito foi ampliado, abrindo assim, maior possibilidade de inserção de todos os membros do povo de Deus no seio eclesial. As opções pastorais feitas ao longo dos anos evidenciaram a sintonia existente entre as necessidades históricas e, o fortalecimento da comunhão entre os membros da hierarquia, dos religiosos e religiosas e dos leigos e leigas.

As assembleias diocesanas que definiram os rumos pastorais desde antes da elaboração do primeiro plano de pastoral, mostraram que, todos os membros do povo de Deus podem contribuir ativamente para o fortalecimento da Igreja.

No ano de 1998, o segundo Bispo diocesano Dom Murilo Krieger escreveu à comunidade de fiéis – clérigos, religiosos e religiosas e leigos e leigas – sobre a vocação do laicato e, destacou a igual dignidade que todos os membros do povo de Deus possuem através do Batismo:

Espero que nossos leigos e leigas vivam, com entusiasmo, seu batismo. Por serem batizados, são discípulos de Jesus, são seus seguidores, e possuem a mesma dignidade que os membros da hierarquia, em nada diferem, a não ser no exercício de um ministério específico. É o próprio Jesus que os chama a um estilo de vida especial. Ele é que os consagra e os envia para serem suas testemunhas nos lugares e situações em que vivem. Levando no coração o Evangelho, que é uma alegre notícia, farão nascer a esperança no coração de muitos (KRIEGER, 1998).


Modelos Pastorais Assumidos pela Igreja Diocesana em seus Planos de Pastoral Orgânica

Como casa da palavra, do pão e da caridade, a Igreja precisou adotar modelos pastorais, que fossem capazes de responder as necessidades do mundo e manifestassem o divino através do humano. Subjacente a cada modelo pastoral, está um modelo eclesiológico, que, foi sendo configurado através das mudanças de época. Para o contexto diocesano da ação pastoral, os modelos assumidos para evangelização da comunidade eclesial, que, está inserida numa sociedade em rápidas e profundas mudanças, foram: a valorização do laicato, a pastoral de conjunto e de comunhão e participação.

A ação pastoral deve estar voltada para a participação coletiva e valorização dos leigos e leigas, através da criação de organismos globais da ação pastoral, como as assembleias e os conselhos. Em decorrência desta necessidade assumida pela Igreja de uma participação comum dos fiéis e a promoção da dignidade das pessoas, a diocese de Maringá assumiu esse compromisso em seus planos de pastoral, sendo este modo que respaldou a construção de seu planejamento pastoral.

Apesar de muitos obstáculos, a Igreja de Maringá, caminhou desde o início dos anos 70 até os tempos atuais, através da dimensão de uma Igreja povo de Deus, incorporando as novas situações que a realidade ia suscitando. Numa atitude profética de impulsionar a “esperança de uma nova terra” (Gaudium et Spes, 39), os planos de pastoral diocesanos sempre tiveram como base de sua elaboração o princípio eclesiológico latino americano, da comunhão e participação.

Todos os planos de pastoral foram elaborados a partir de uma assembleia diocesana, contando com a participação ativa dos leigos e leigas e dos religiosos e das religiosas. As prioridades e objetivos elencados, sempre tiveram em sintonia com a realidade de cada tempo.

Assim, no caminho aberto pelo Vaticano II, por Medellín e Puebla e pela Igreja no Brasil, a diocese de Maringá, sempre se preocupou com a inserção da fé na vida prática das pessoas, comprometendo-se muito logo com as situações e os reclamos vividos pelo povo. Através de seu planejamento pastoral, dos planos de pastoral diocesano e da participação ativa de todos os fiéis, tornou-se uma diocese que sempre buscou “um novo jeito de ser Igreja”, e se dispôs a caminhar em busca de uma sociedade justa e fraterna.


Pe. Eduardo Batista