Nota sobre o uso moralmente aceitável de algumas vacinas anticovid-19

11 de Março de 2021

Nota sobre o uso moralmente aceitável de algumas vacinas anticovid-19

“Confiamos-Te todas as nossas preocupações, porque Tu tens cuidado de nós” (IPd 5, 7).

A pandemia da COVID-19 é uma das grandes tragédias humanitárias desde as grandes guerras, carregada de sofrimentos e angústias que oprimem a humanidade inteira. Famílias sofrem com a perda de seus entes queridos, assim como também se afligem as milhares de pessoas que adoeceram ao redor do mundo, tendo vivenciado quadros brandos, casos graves com longos períodos de internação e alguns até com desenvolvimento de sequelas. Após um período de queda em novos casos e mortes, os números voltaram a aumentar, com riscos reais de colapso da nossa infraestrutura social e psicológica.

Nessa conjuntura, uma questão é frequentemente levantada nos debates insistentes na opinião pública e política, no que diz respeito ao uso de materiais biológicos no desenvolvimento de algumas vacinas. A Pontifícia Academia para a Vida, em junho de 2005, fez um importante pronunciamento elucidando essa questão e comentando sobre a violação da dignidade com o uso indevido de células derivadas de linhagem fetal humana por abortos provocados.

Sobre as vacinas anticovid-19, deparamo-nos com a dolorosíssima notícia que, infelizmente, alguns poucos desenvolvedores colocaram desnecessariamente as famílias novamente em uma posição difícil, por terem incorporado, do mesmo modo, esse material biológico antiético no desenvolvimento e/ou na testagem dos seus imunizantes.

Com efeito, em um período pandêmico como esse de gravíssimos danos, a Igreja Católica, em dezembro de 2020, forneceu a orientação por meio da Congregação para a Doutrina da Fé, ponderando ser “moralmente aceitável utilizar as vacinas anticovid-19 que tiverem utilizado linhas celulares de fetos abortados no seu processo de investigação e produção”.

A instrução do uso moralmente lícito desses tipos de vacinas não se dá “porque as prefira em si mesma, mas porque julga conveniente permiti-las”[1], devido às condições particulares, na tentativa de controlar de maneira mais exitosa a possível doença. A nota recorda que, entre outras coisas, o risco de: “ficar doente leva a um aumento de hospitalizações, resultando em uma sobrecarga para os sistemas de saúde, até um possível colapso”, como está acontecendo nesta nação e noutros países, “dificultando o acesso aos cuidados de saúde”.

Lê-se que: “quando não estiverem disponíveis vacinas contra a Covid-19 eticamente, (...) em tal caso, podem-se usar todas as vacinas reconhecidas como clinicamente seguras e eficazes com a consciência certa de que o uso de tais vacinas não significa uma cooperação formal ao aborto do qual derivam as células a partir das quais as vacinas foram produzidas”. A nota da Congregação declara contundentemente que o uso, nestas condições: “não pode, por si só, constituir uma legitimação, mesmo indireta, da prática do aborto, e pressupõe a oposição – clara – a essa prática por parte daqueles que a ela recorrem”.

A Igreja recorda ainda tratar-se de: “um imperativo moral – a todas organizações responsáveis – (...) que as vacinas, eficazes e seguras do ponto de vista da saúde”, estejam disponíveis e “acessíveis inclusive aos países mais pobres e de modo não oneroso para eles, visto que, a privação de “acesso às vacinas” se transforma em um “motivo de discriminação e de injustiça”.

O Papa Francisco, ao ser imunizado, recomendou que eticamente: “todo mundo deveria tomar a vacina. É uma opção ética porque você aposta na saúde, na sua vida, mas também na vida dos outros”.

Rogamos a Deus, pela intercessão de Nossa Senhora da Glória, luz e proteção às famílias que perderam seus entes queridos acometidos pela COVID-19, aos que estão lutando pela recuperação, e também aos médicos, enfermeiros, agentes de saúde, voluntários, que neste período de emergência, estão na vanguarda, arriscando a própria vida para salvar outras. Alcançai-nos a graça de Deus, para que venha em nosso socorro, libertando-nos desta terrível pandemia, de modo que a vida possa retomar com serenidade seu curso normal. Amém.

Maringá (PR), 11 de março de 2021.


Dom Frei Severino Clasen, ofm

Arcebispo Metropolitano de Maringá


[1] Cf. AQUINO, Tomás de. Suma Teológica – Vol. I. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001, p. I, a. 9, q. 19, r. 3, p. 274.