Opinião: Brasil: depressão, melancolia ou luto?

07 de Junho de 2016

Opinião: Brasil: depressão, melancolia ou luto?

Uma aluna procurou-me para lhe orientar uma pesquisa sobre a relação depressão e aprendizagem. A hipótese é se a depressão em crianças ou adolescentes faz cair o grau de aprendizagem, e se professores sabem lidar com alunos deprimidos em sala de aula.

O senso comum diz que: sim, conheço uma criança cuja mãe faleceu e afetou drasticamente a sua vontade de ir à escola, aprender os conteúdos, e o resultado foi muito baixo. O filme francês “Ponette, a espera de um anjo” (1996) reforça a hipótese acima: uma menina [Ponette] que aos 4 anos tem que lidar com a perda da mãe. Talvez Ponette não viva uma verdadeira depressão, mas sim, o luto ‘normal’, que pessoa de qualquer idade pode sofrer, a partir de uma perda real ou simbólica.

Depressão é uma doença psíquica ou mental, que tem vários sintomas, não necessariamente ligados à perda de um ente querido, mas sim a perda do próprio Eu (Ego). E luto normalmente desenvolve tristeza, que as circunstâncias e o tempo se encarregam de ser superado.

A distinção entre luto e melancolia foi inicialmente realizada pelo pai da psicanálise, Sigmund Freud (1915). O saudoso médico e escritor gaúcho, Moacir Scliar, atualizou tal distinção de modo breve: “diferente da tristeza que é passageira; do tédio, que nos dá a sensação de que o tempo não passa; da depressão, termo moderno para uma condição clínica psicológica associada a fatores psicossociais, a melancolia, até pode ser uma doença (como a depressão) como pode ser apenas um estado de espírito, que embora possa causar no sujeito uma perspectiva sombria da vida, do mundo e das relações sociais, também pode ser uma fonte de inspiração para a criação literária, música, cinema, teatro, até mesmo política messiânica”.

Depressão é sentir ausência de sentido da vida, é um árduo desânimo e desinteresse pelas coisas do mundo, ruminação de experiências ruins que parecem "não sair da cabeça", pensamentos de morte e morrer, baixa autoestima, até alcançar um patamar de desejo de autopunição.

Aristóteles (300 a.C.), reconhecia uma relação direta entre melancolia e homens criativos, na filosofia, literatura, artes em geral. Recentemente autores reconhecem que a literatura está repleta de exemplos de personalidades melancólicas, às vezes com final trágico (Virginia Woolf, Ernest Hemingway); Dostoievski, Kafka, Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Pedro Nava, Augusto dos Anjos, e tantos outros “bons melancólicos”. Será que suas obras nasceram da melancolia?

Também, muitas pessoas são bipolares, isto é, oscilam entre um estado de depressão e de mania, na qual a pessoa se sente “energizada” e pode trabalhar com muito entusiasmo.  Entre os escritores diagnosticados como bipolares estão Hans Christian Andersen, F. Scott Fitzgerald, Nicolai Gógol, Graham Greene, Ibsen, Robert S. Stevenson.   

Ainda há um ponto de vista interessante observado pelo escritor norte-americano, William Styron, que viveu profunda depressão, e depois de superada escreveu o livro “Perto das trevas”, contribuiu com o documentário de TV “Desânimo mortal”. Ele critica o termo depressão, que “pode ser usado tanto para designar um buraco no chão como uma queda de ciclo econômico”.

Mesmo assim, a depressão pode evocar um sentido mais amplo: lembra fábricas fechadas, desempregados, fome. A grande depressão econômica dos EUA, de 1929, ou Crise de 1929. Também no campo social, a depressão social e econômica vem depois da fase maníaca (com pessoas consumindo compulsivamente). Assim, o que acontece com um indivíduo também pode acontecer com as sociedades “doentes”: existe a depressão social, econômica, política, cultural, etc.

Ao leitor: será que os brasileiros, vivem hoje uma depressão/ desânimo mortal, ou melancolia, luto? Qual seria o tratamento?

 

Por Raymundo de Lima

Publicado na revista Maringá Missão de junho de 2016