Reflexão: Liturgia do XVIII Domingo do Tempo Comum, Ano A – 02/08/2020

27 de Julho de 2020

"Reflexão: Liturgia do XVIII Domingo do Tempo Comum, Ano A – 02/08/2020"

Fundamentos do agir cristão: promoção humana, libertação integral e caridade evangélica

Na Liturgia deste Domingo, XVIII do Tempo Comum, veremos, na 1a Leitura (Is 55, 1-3), que o povo Judeu estava sofrendo no exílio, sofrendo por causa da fome, da miséria, sofrendo com a falta de bens básicos e de cidadania. O profeta anima o povo e constata:

- situação de carência: “vós que estais com sede”;

- dependência econômica: “vós que não tendes dinheiro”.

O profeta crê na conversão do povo e tem convicção no Deus da Aliança: “Ouvi-me com atenção e alimentai-vos bem, para o revigoramento do vosso corpo... Vinde a mim... Farei convosco um pacto eterno”. Este pacto será de vida em liberdade, terra repartida, moradia, saúde etc., isto é, os bens da criação serão para todos, sem que uns se apoderem, se aproveitem e falte o necessário para os outros. O Papa São João Paulo II, no início do milênio, já falava da necessidade de se pautarem, decididamente, os processos de globalização econômica em função da solidariedade e do respeito devido a cada pessoa humana e deixava no ar a pergunta: “Como é possível que, no nosso tempo, ainda haja quem morra de fome, quem esteja condenado ao analfabetismo, quem viva privado de cuidados médicos elementares, quem não tenha casa onde se abrigar?” (NMI, 10 e 14).

Se “o desenvolvimento é o novo nome da paz”, conforme nos ensinou Paulo VI, só alcançaremos a paz tão desejada na medida em que a economia, de fato, colocar-se a serviço do ser humano, invertendo-se a lógica do mercado hoje prevalente, como não se cansa de falar o Papa Francisco. Confiemos na Palavra de Deus e a coloquemos em prática, pois ela sustenta nossa alma e nosso corpo: “Às almas Ele dá a Palavra, aos corpos à cura e o alimento”. “Aquele que vem a mim não terá mais fome... nem sede...“. “O pão nosso de cada dia nos daí hoje...”.

Na 2ª Leitura (Rm 8, 35.37-39), o apóstolo Paulo nos apresenta as consequências do ser cristão, diante da vida ameaçada: “Não vos conformeis com este mundo de tribulação, angústia, perseguição, fome, nudez, perigo, espada”. Ser cristão é lutar, é estar no campo de batalha, mas, com certeza, o amor é indestrutível. Somos vencedores, já.

No Evangelho (Mt 14, 13-21), vemos que o pão distribuído a todos é a marca da ação de Jesus. Os discípulos precisam imitar Jesus para que todos tenham o necessário: sentir compaixão e saber agradecer. Vejamos algumas chaves de leitura para melhor compreender este texto:

1º) Consciência de Jesus: soube da morte de João Batista. Na corte, houve um banquete de Herodes e seus aliados, isto é, um Projeto Político em benefício próprio (politicagem), sendo a causa da pobreza. Para ostentar vida de luxo, matam a vida e a esperança do povo. João Batista denunciava, incomodava: “Raça de víboras”, não pactuava com Herodíades. Os grupos religiosos da época eram coniventes com a situação de adultério da rica e da corte, mas denunciavam a pobre mulher adúltera. A morte da profecia alimenta a festa dos poderosos.

A Igreja, hoje, deve estar de qual lado? Dos que dominam e manipulam a opinião pública ou do lado dos Movimentos Populares que visam um mundo melhor, de partilha, justiça e dignidade para todos.

2º) Jesus ‘viu’ a multidão: Jesus é pastor, é líder. Ele devolve a esperança e não despede ninguém de mãos vazias. Ele é o “Novo Maná”. Jesus é pastor que ama, cura, carrega ao colo a ovelha machucada, mas, também, enfrenta o lobo com seu cajado. Nosso cajado é nossa arma: conscientização – a consciência transforma a realidade.

3º) comportamento das pessoas na multidão: Alguns buscam milagres mágicos, enquanto que o maior milagre é “cair em si” (tomar consciência). Não vamos deixar para Deus fazer aquilo que compete a nós. Jesus exige compromissos. Em João, capítulo seis, após a pregação, Jesus fica só. Nossos líderes religiosos, hoje, ousam na profecia ou silenciam em torno de temas essenciais. Os donos da memória não devem se tornar donos do esquecimento.

4º) Responsabilidade e mentalidade dos discípulos: despedem as multidões. Eles se preocupam somente com o pão do espírito e que cada um se vire. Jesus põe a fé à prova, quer que enfrentemos os problemas, a responsabilidade pelas pessoas sofridas não pode ser transferida. Somos responsáveis pela fome no mundo. “Por que gastar dinheiro com outra coisa que não o pão” (Is 55, 2). A partilha, hoje, seria melhorar as políticas públicas, edificar uma sociedade alternativa sem a concentração de renda.

5º) O milagre: acontece a partir do que as pessoas tinham: cinco pães e dois peixes. Jesus saciou milhares de pessoas com fome, mas Jesus pediu a contribuição humana, como nos pede hoje: nosso trabalho, nossa solidariedade, nosso dízimo e nosso amor. Cinco pães e dois peixes, mesmo impotentes, quando partilhados, todos ficam saciados e ainda sobra.

6º) O milagre: “Dai-lhes vós mesmos de comer!”. Conversão para o espírito da partilha, banquete da justiça. Partilha: sinal de um novo modo de vida que nasce da organização do povo. Compromisso com uma sociedade justa, ideia revolucionária.

Eucaristia é mero rito ou força revolucionária de alimento libertador? Qual a boa notícia que anunciamos? Mencionamos as causas da pobreza, ou tanto faz? Exemplo: Dom Helder dizia: “Se ajudo os pobres me chamam de santo, se aponto as causas da pobreza me chamam de comunista”.

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.


Pe. Leomar Antonio Montagna

Arquidiocese de Maringá – PR