Reflexão: Liturgia do XXX Domingo do Tempo Comum, ano B – 24/10/2021

18 de Outubro de 2021

"Reflexão: Liturgia do XXX Domingo do Tempo Comum, ano B – 24/10/2021"

Deus tem um cuidado especial com aqueles que mais sofrem

Na Liturgia deste Domingo, XXX do Tempo Comum, veremos, na 1a Leitura (Jr 31, 7-9), que o papel do profeta, além de anunciar e denunciar, é também animar, pela Palavra de Deus, as pessoas que estão sem esperança e perderam sua autoestima. Ele diz que Deus tem um cuidado especial com aqueles que mais sofrem.

O Papa Francisco, na Evangelii Gaudium (A Alegria do Evangelho), nos diz que a experiência de Deus toca o nosso coração e gera a alegria que ninguém poderá nos tirar. O Papa adverte: “Há cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa” (EG, 5 e 6). Consequentemente, um evangelizador não deveria ter constantemente uma cara de funeral (EG, 10). O Papa vê, no desânimo e no egoísmo, uma ameaça à fé: “Desenvolve-se a psicologia do túmulo que, pouco a pouco, transforma os cristãos em múmias de museu. Desiludidos com a realidade, com a Igreja ou consigo mesmos, vivem constantemente tentados a apegar-se a uma tristeza melosa, sem esperança, que se apodera do coração como ‘o mais precioso elixir do demónio” (EG, 83). Ele também nos diz para não deixar que nos roubem a alegria e a esperança, pois algumas pessoas: “Nos tempos atuais, não vêm senão prevaricações e ruínas. Mas a nós parece-nos que devemos discordar desses profetas de desgraças, que anunciam acontecimentos sempre infaustos, como se estivesse iminente o fim do mundo... Quem começa sem confiança, perdeu de antemão metade da batalha e enterra os seus talentos” (EG, 84 e 85).

Como o profeta Jeremias, o Papa Francisco anuncia a esperança para os pobres: “Desejo uma Igreja pobre para os pobres”, mas, além de ser pobre para os pobres, a Igreja querida por Francisco é valente na hora de denunciar o atual sistema econômico, injusto desde a raiz (EG, 59). Ele nos faz um apelo: Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, escutá-los e compreendê-los. Em Gálatas 2,10, o critério chave de autenticidade da Igreja é ‘não se esquecer dos pobres’. Em Mateus 25, 34-40 a misericórdia para com os pobres é a chave do Céu” (EG, 195, 197 e 198).

O Papa fala por aqueles que não têm voz, ninguém se preocupa quando ele abraça os doentes e ama os pobres. Mas, quando ele se atreve a refletir sobre as causas morais e estruturais da pobreza, essa é outra questão. Como Dom Hélder Câmara, outro arcebispo profético da América Latina, observou notoriamente: "Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista". Certas coisas nunca mudam.

Na 2ª Leitura (Hb 5, 1-6), a Palavra de Deus nos diz que todos somos cercados de fraquezas, por isso devemos ter compaixão uns pelos outros. Na grande família humana, somos todos por um, um por todos e todos por todos.

No Evangelho (Mc 10, 46-52), vemos que Jesus saiu de Jericó em direção à Jerusalém, Bartimeu, “cego e mendigo estava sentado à beira do caminho”, isto é, imobilizado pelas suas carências, sem horizontes, não sabe onde ir, totalmente dependente, está à margem da alegria de viver e conviver com dignidade. Mas, nisto, ouve dizer que Jesus estava passando; então, toma consciência de que Jesus está muito perto de sua vida, de suas dores, carências e sofrimentos. Começa a gritar: “Tem misericórdia de mim”. Como diz uma canção muito edificante para nossa alma: “Tenho esperado esse momento, tenho esperado que viesses a mim”.

O texto diz que “muitos o repreendiam para que calasse”. Aqui, vemos que a sociedade que manda o cego calar é a mesma que trama o fim de Jesus, não tolera quem vê a realidade a partir dos oprimidos, não se importa com os gritos dos que passam fome e que estão carentes de cidadania, não toleram a luta e a pressão popular; querem silenciar os profetas, pois vivem na total ignorância, com ódio no coração e cegueira moral. Querem que a miséria permaneça oculta, que não se mostre, que não perturbe. São os ricos na real miséria, cegos de Deus.

“O grito do cego é o mesmo grito do povo pobre e oprimido que incomoda os bem instalados, os que estão tranquilos na sua vidinha cotidiana e não desejam mais um competidor nos seus espaços e privilégios, os que se sentem ameaçados pela ascensão do pobre. A história de Bartimeu pode se repetir ainda em nossos dias quando nos opomos às conquistas dos marginalizados” (Pe. Nilo Luza, Folheto ‘O Domingo’, nº 50, 2015).

Mas, Bartimeu venceu os impedimentos daqueles que o mandavam calar-se. Jesus ouviu o seu grito, parou e mandou chamá-lo. “Deus ouve o clamor dos oprimidos, vê a miséria, conhece os sofrimentos e desce para ajudá-los”.

Graças a Deus, próximo ao cego, estavam pessoas solidárias (Pastorais Sociais) que, sensíveis à sua condição desumana, o chamam para uma experiência de Deus libertador: “Coragem, levanta-te, Jesus te chama”. Então, ele rompe com a margem, salta para a vida nova, compreende que cegueira é não ter fé, não ver o Projeto de Deus que quer vida em abundância para todos e não só para uma pequena minoria que domina a imprensa de forma maléfica e impede políticas públicas de inclusão dos menos favorecidos. A iniciativa da fé fez com que recobrasse a visão e, iluminado e liberto, seguisse Jesus. Com isso, nos ensina que, por mais dura que seja a realidade, sempre é possível mudá-la para melhor.

Enfim, o princípio da fé é reconhecer a miséria, invocar a misericórdia e, alcançada a graça, seguir Jesus, multiplicando o bem. “Ele passou a vida fazendo o bem”. Neste sentido, Bartimeu é cada um de nós. Jesus nos ajuda a abandonar o ‘manto’ do egoísmo e da submissão às ideologias dominantes para nos tornarmos pessoas solidárias e comprometidas com um mundo melhor, mais humano e mais digno. Mesmo se já velhos, temos que, todos os dias, nascer de novo.

 

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.

Pe. Leomar Antonio Montagna

Presbítero da Arquidiocese de Maringá – PR