Reflexão litúrgica: terça-feira, 18/07/2023 – 15ª Semana do Tempo Comum

18 de Julho de 2023

"Reflexão litúrgica: terça-feira, 18/07/2023 – 15ª Semana do Tempo Comum"

“NÃO HÁ SANTO SEM PASSADO E NEM PECADOR SEM FUTURO” (PAPA FRANCISCO) 

Na Liturgia desta terça-feira, XV Semana do Tempo Comum, vemos na 1ª Leitura (Ex 2,1-15a) que se busca dar uma origem hebraica para o nome de Moisés que é egípcio, e incluí-lo no povo eleito. O movimento de resistência segue com a mãe e a irmã de Moisés, e envolve a própria filha do faraó. 

Moisés, embora educado em meio à classe dominante, sai e vê a situação de seus irmãos. Esse ver o leva à solidariedade, ao gesto de defender um irmão. Por sua vez, porém, compromete sua própria segurança matando o egípcio. Imediatamente, a classe dominante se torna hostil e Moisés tem que fugir. Em toda essa complicada aventura, não se sente ainda a sombra sequer de uma presença divina. Mas é evidente que Deus se servirá de todos esses caminhos bifurcados, que se interceptam e sobrepõem, para traçar o roteiro de sua intervenção salvadora e libertadora. O futuro libertador do povo hebreu é um “libertado”, alguém que fez experiência da condição de escravo. Antes mesmo de se sentir investido da missão de libertador do povo escravo, Moisés sente-se solidário com os irmãos que sofrem. A lei da solidariedade entre todas as pessoas vigora ainda mais depois da vinda de Cristo. 

Assim como Moisés, na história, muitas pessoas passaram por grandes desafios, mas provaram que é possível vencê-los. Exemplos: Santo Expedito, São Francisco, Che Guevara, Irmã Dulce, Madre Tereza e tantas outras. 

Alguém pode estranhar ou até questionar por que citar Ernesto Che Guevara, não é para fazer dele um Santo, mas para dizer que foi alguém que tivera uma trajetória de vida em favor dos oprimidos, sendo ele mesmo vítima de todo tipo de violência. Mesmo que não se aprove o método utilizado por ele, não se pode ignorar suas lutas e o contexto em que viveu (embora o próprio Catecismo da Igreja diz que em defesa da vida se pode matar, acredito que se quisermos construir uma cultura da paz, jamais matar, mesmo que sejamos vítimas da violência, isto é, se queremos construir a paz). Na América Latina, o imperialismo norte-americano em conluio com as elites locais, assassinaram mais de 500 mil pessoas entre a época que viveu Che (1928-1967) até os anos 90, portanto, não se pode julgar com os critérios de hoje e condenar somente uma pessoa ou um lado. Os próprios bispos da Conferência Episcopal Latino Americana disseram em Medellín (1968), depois Puebla (1979) que “vivemos em um continente oprimido e de uma injustiça institucionalizada”, isso seria equivalente a dizer que não vivíamos diferente do povo escravizado no Egito, no tempo de Moisés. O Faraó e sua coorte não se compadeciam daquela situação, então Deus chamou Moisés, que havia assassinado um Egípcio para ser o libertador do seu povo. 

“Quando Moisés era já homem, ia ter com os seus irmãos de raça e começou a dar-se conta das terríveis condições em que viviam e trabalhavam. Certa vez viu mesmo um egípcio a bater num dos seus irmãos hebreus! Não se conteve. Olhou dum lado e doutro para se certificar de que ninguém mais lhe via, matou o egípcio e enterrou o corpo na areia para o esconder” (Ex 2,11-23). 

Penso que as pessoas que assumem às realidades complexas e lutam em favor dos oprimidos são as que possuem uma grande graça de Deus, os que são tocados por Deus, se nós não tivermos esta graça, mas se pelo menos não criticarmos os que lá estão, já seria um grande avanço dentro da Igreja, caso contrário criticando-os e condenando-os estaremos criticando e condenando o próprio Deus, “que conhece os sofrimentos, vê a opressão, ouve o clamor e desce para libertar, por meio de Moisés” (Ex 3,7-9), assim muitos que hoje criticam qualquer conotação do evangelho para o social, certamente, se estariam lá, teriam ficado do lado do Faraó e sua coorte e não de Moisés, acham que Deus só chama pessoas de dentro do acampamento:Então alguém disse: Eldad e Medad estão profetizando fora do acampamento, proíbam-lhes... Tens tu ciúmes por mim? Quem dera que todo o povo do Senhor fosse Profeta, e que o Senhor pusesse o seu espírito sobre todos” (Nm 11,27-29). 

Não podemos julgar as pessoas e muito menos uma situação tão complexa como a mencionada no período das ditaduras em toda a América Latina. No mais, o Papa Francisco nos recorda que “não há santo sem passado e nem pecador sem futuro”, então porque não crer na “Comunhão dos Santos” e na purificação de todo pecado pela misericórdia de Deus, mesmo dos que já morreram e que foram considerados pecadores. 

Se não nos abrirmos a graça de Deus, corremos o risco de rejeitar o Deus da vida que nos quer falar de muitos modos, inclusive por meio do Papa Francisco, mas estes “juízes de plantão” já estão dizendo que ele é comunista e rezam assim, por aí: “Senhor, iluminai-o ou eliminai-o”. Ter este tipo de gente em nossa Igreja, não precisaremos de inimigos e pouco falaremos ao mundo, pois foi vendo a falta de testemunho de algumas dessas pessoas que Mahatma Gandhi dizia: “Amo o Cristo, mas não admiro o modo que vivem os cristãos”. 

No Evangelho (Mt 11,20-24), Jesus lamenta que cidades de Israel que puderam contar com sua presença tenham rejeitado a mensagem do Reino e da justiça de Deus, mensagem essa concretizada na atividade de Jesus junto aos mais necessitados. Por isso serão julgadas mais severamente que outras cidades estrangeiras, denunciadas em textos proféticos como símbolos da perdição, pois afinal estas não tiveram a mesma oportunidade dada às cidades de Israel. “A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido” (Lc 12,48). 


Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus. 


Pe. Leomar Antonio Montagna 

Presbítero da Arquidiocese de Maringá - PR 

Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças, Sarandi - PR