Artigo – A Carta Pastoral de Dom Severino: Primeiras impressões

20 de Agosto de 2021

Artigo – A Carta Pastoral de Dom Severino: Primeiras impressões

No último dia 15 de agosto nosso arcebispo Dom Frei Severino Clasen publicou sua Carta Pastoral, intitulada Acolher e cuidar, por ocasião do 1º aniversário do início do seu ministério episcopal em nossa arquidiocese de Maringá. Uma carta pastoral é um documento pessoal do bispo onde, costumeiramente, se apresenta reflexões, exortações e proposições para o exercício do seu pastoreio junto aos fiéis. A exemplo do apóstolo Paulo que se correspondia com as comunidades que fundava exortando e orientando a vida cristã, Dom Severino toma para si esta antiga prática eclesial e nos provoca para refletirmos a caminhada pastoral de nossa Igreja Particular. O texto da Carta Pastoral, permeado de passagens bíblicas e citações do Magistério recente, é um convite ao diálogo com todas as forças vivas da Igreja diocesana, conclamando padres, diáconos, religiosos e leigos e leigas a reorganizar a ação evangelizadora, a partir da sinodalidade eclesial, tão enfatizada pelo Papa Francisco.

A Carta Pastoral constituída de 159 páginas e distribuída em três capítulos nos faz buscar em nossas raízes históricas e teológicas a compreensão do presente, acrescida da experiência pessoal de um pastor franciscano afeiçoado pela valorização de uma Igreja ministerial, onde todos – todo o Povo de Deus – é parte constitutiva e fundante na edificação do Reino de Deus. A caminhada de evangelização de nossa arquidiocese agora se mescla na experiência de um pastor vindouro das terras do contestado catarinense, onde juntos, planejaremos os próximos passos na evangelização, almejando um futuro que possibilite a transmissão da fé que nos foi confiada no presente. Cada geração tem seus próprios desafios no testemunho e na transmissão do Evangelho, mas o Espírito Santo toca a inteligência e a sabedoria de pastores em ouvir o sensus fidei para interpretar os sinais de cada época e transformá-los em ação pastoral.

Dom Severino é o primeiro bispo que não conheceu pessoalmente Dom Jaime Luiz Coelho, na sua missão episcopal de quarenta anos como pastor desta diocese (1957-1997). Na sua Carta Pastoral reconhece a importância deste intrépido bispo na fundação desta Igreja à luz da efervescência do Concílio Vaticano II (1962-1965), no importante auxílio dos religiosos, na formação de um clero autóctone e na organização pastoral de paróquias e pastorais. Mesmo não conhecendo pessoalmente Dom Jaime, distante há oito anos de sua morte, Dom Severino se utiliza do relato daqueles que testemunharam seu pastoreio, além de buscar nas preciosas páginas do historiador e cronista Padre Orivaldo Robles as informações necessárias para compor o rico mosaico de padres, religiosos e leigos que construíram esta história em nossa diocese. Na sequência menciona os demais bispos que aqui pastorearam, indicando que não veio para fundar uma nova Igreja, mas dar prosseguimento ao caminho iniciado por seus predecessores. Longe de querer rupturas com sua história, Dom Severino deseja colocar um tijolo a mais neste edifício eclesial, evidentemente com sua própria marca, trazendo consigo suas experiências vividas e sua compreensão de Igreja que os tempos novos lhe impõe no exercício episcopal.

A Carta Pastoral tem um tom positivo a respeito da Arquidiocese quando descreve os seus padres e leigos. Apresenta suas diferenças eclesiológicas e geracionais que, muitas vezes geram conflitos e discórdias, mas que ao final das contas prevalece a comunhão eclesial. Dom Severino fala bastante dos padres incentivando-os ao trabalho pastoral em fidelidade ao Concílio Vaticano II, exortando-os para viver o ministério presbiteral de acordo com as orientações da Igreja, sem ostentação e privilégios. Particularmente caro é o seu empenho para com os leigos e os religiosos, pois o bispo além de ser religioso franciscano foi presidente da Comissão para o laicato junto a CNBB, imprimindo-lhe uma forte atenção à formação e organização dos leigos nesta Igreja sinodal que almeja imputar cada vez mais em Maringá. Seja ao clero, ou ao laicato e aos religiosos, para todos exorta a renunciar uma espiritualidade intimista e uma Igreja paralela fora da comunhão eclesial, tão necessária para a catolicidade da Igreja.

O bispo também disponibiliza a Arquidiocese de Maringá na construção de uma sociedade onde a vida civil seja possível a todas as pessoas, indistintamente. A Igreja nunca se imiscuiu de colaborar na resolução dos problemas da cidade, buscando junto com as autoridades políticas e o poder público, consensos e tratativas que favoreçam o interesse coletivo, sobretudo dos mais pobres. Aliás, nossa arquidiocese acompanha o desenvolvimento da cidade, sendo nossas paróquias testemunhas vivas que o surgimento de um novo bairro é a certeza do surgimento de uma nova comunidade cristã. O bispo reivindica uma cidade para todos sem exclusão de ninguém, chama a atenção das autoridades políticas e exorta os fiéis a combater o preconceito de cor, gênero, religião, a desigualdade social, as condições econômicas precárias de muitas famílias, entre tantas situações de sofrimento que abatem a população. O clamor e exortação do pastor se estendem para o cuidado com a natureza, preservando nossas matas e rios, sendo cuidadores da casa comum.

Por fim, o bispo convida a todos para dialogar com ele a respeito da evangelização para os próximos anos. Sua marca pessoal no governo desta Igreja começa na preocupação de dar maior agilidade e qualidade na ação evangelizadora das pastorais, movimentos eclesiais, serviços e organismos presentes na diocese. Aquilo que inicialmente o bispo apelidou de “guarda-chuva”, se referindo ao conjunto de trabalhos que convergem para uma mesma ou semelhante ação pastoral, Dom Severino propõe reorganizar todas as forças vivas em três categorias pastorais: dimensões, setores e comissões. A primeira dela contempla três dimensões: a dimensão de comunhão missionária, quando se atenta para a vida interna de uma comunidade; a dimensão sociotransformadora, tendo na Cáritas diocesana o eixo dinamizador de todas as iniciativas sociais da Igreja; e por fim, a dimensão do diálogo Igreja e sociedade, em vista de possibilitar o encontro fraterno e a troca de experiências com outras denominações cristãs e outras religiões não-cristãs. Na sequência propõe impulsionar algumas iniciativas em setores, fortalecendo aqueles que já existem ou mesmo constituindo novos setores. A família, a juventude, a comunicação e os movimentos eclesiais/novas comunidades são os titulares destes setores que se pretende fazer uma ação evangelizadora comum, respeitando, evidentemente, a especificidade e o carisma de cada um dos segmentos. A unidade na diversidade. E, por último, o bispo propõe constituir duas comissões, onde todos os segmentos da arquidiocese devem se envolver: a iniciação à vida cristã e a formação sistemática e permanente do laicato.

A Carta Pastoral não é um documento legislativo, por isso não tem força de lei canônica, mas um instrumento onde o bispo se permite em colocar suas ideias para discutir e dialogar com todos. O momento agora é de acolher a Carta Pastoral, ler atenciosamente os seus ricos parágrafos, discutir com a comunidade e outras pessoas interessadas, no intuito de abrir um grande debate sobre a ação evangelizadora de nossa arquidiocese. A Assembleia Arquidiocesana será a grande ocasião de sistematizar e refletir as propostas do bispo, juntamente com tantas outras ideias que nascerão do debate desta Carta Pastoral, culminando assim num Plano de Pastoral resultado da sinodalidade e da confirmação episcopal de nosso pastor.


Pe. Marcos Roberto Almeida dos Santos

Maringá-PR., 17 de agosto de 2.021

mralmeidas19@hotmail.com